domingo, 10 de julho de 2011

Projeto Jardins do Adriano

Motivações:
Neste lugar não tem nada de bonito.”
Esta frase, já familiar,  ecoou na  sala de aula de uma pequena escola municipal, situada em uma imensa área verde da cidade de Gravataí, no Rio Grande do Sul, chamando a atenção da professora, durante  uma aula de Artes, no fim do ano letivo de 2008.
Esta, por sua vez, considera um privilégio lecionar naquele local. Para ir à escola, parte de sua residência, localizada em um bairro movimentado e barulhento da cidade de Porto Alegre. Entre os ruídos e a pressa segue o trajeto , inicialmente poluído e cinzento  que, aos poucos, ganha outros ares na medida em que se aproxima da escola. Diferentes modos de viver, diferentes olhares.
Surge então, no início do ano letivo de 2009, o projeto Jardins do Adriano. Inspirado nos Jardins do Monet, o trocadilho recebe o nome da escola. 

Justificativa:
Falar em paisagismo é falar sobre uma atividade que sempre esteve à serviço do homem e torna-se cada vez mais necessária para a vida harmônica no próximo milênio.
Jardim é um termo universal que adquire conceitos ao longo do tempo e em diferentes culturas como parte de um conjunto de espaços livres e abertos, incluindo tanto os públicos ou privados.
A essência do jardim parece significar um gesto na paisagem como algo inerente ao convívio do homem com a sociedade em resposta aos seus impulsos. É nessa compreensão que a expressão humana se aproxima mais da arte e da poesia e atinge o conteúdo do paisagismo, em outras palavras, “A Arte de fazer jardins” (DOURADO, 1991, p.63)
O Paisagismo, além de sua função ecológica, se reveste de uma função social inegável, promovendo o convívio comunitário. Assim como a própria arquitetura, possibilita um campo multidisciplinar, envolvendo a matemática, as ciências naturais e sociais, a engenharia, as artes, a tecnologia, a política, etc.
A arte do paisagismo tem acompanhado e participado da história do homem. Não são os Jardins Suspensos da Babilônia uma das sete maravilhas do mundo?

Estratégias de ensino:
”Atrás de um bom projeto paisagístico existe sempre criatividade, mas também, uma boa dose de conhecimento”.
O  ponto de partida para os estudos é a  paixão de  Claude Monet pela jardinagem. Nas aulas de Artes buscaremos inspiração em suas pinturas , onde ele retratou os famosos jardins em todas as épocas do ano. Quando ele instalou o jardim aquático, entre 1893 e 1901, foi necessário aquecer o pequeno lago para a colocação das ninféias  que mandou trazer do Japão pois,  sendo flores sensíveis,   necessitavam de temperaturas menos frias do que as oferecidas pela água do lago. Sobre a parte mais estreita deste lago  foi construída uma ponte, em estilo japonês, retratada em inúmeras obras do pintor. A combinação entre o estilo da ponte e a colocação das plantas japonesas permitiu que o jardim de Monet passasse a ser chamado “ jardim japonês”.
Frequentemente percebemos que nossos alunos  se agitam demais e brigam muito durante o recreio.
Porém, precisamos avaliar as condições do pátio escolar. Este não possui espaços para o aluno sentar e relaxar, e no verão carece de sombra. Diante desta percepção, escolhemos os jardins japoneses como inspiração para a implantação do paisagismo no pátio escolar, uma vez que estes possuem um ar espiritual onde reina a harmonia e quem entra nesta atmosfera tem a nítida impressão de estar num templo de meditação. A espiritualidade está por toda a parte e os seus elementos indispensáveis  representam a vida, proporcionam sensações de paz e tranqüilidade.
Outro objeto de nossos estudos será a produção paisagística de Burle max, que além de paisagista era também desenhista, pintor, tapeceiro, ceramista, escultor, pesquisador, cantor e criador de jóias, um homem de muita sensibilidade, um iluminado pela arte.
Para um jardim ser bem planejado é preciso, antes de tudo, realizar um estudo. É primordial conhecer as plantas características da região, sua reprodução e produção, bem como as exigências de cultivo de cada uma e promover interações entre flora e os animais do entorno.
Além do planejamento é necessário ter paciência para aguardar o desenvolvimento das plantas. É o trabalho no jardim, fazer força em alguns momentos, ser delicado no outro.
A partir do momento que se conhece as características destas plantas é possível manipular as qualidades físicas, que se apresentam de duas formas, através da matéria prima da estética e da beleza. Nesta etapa serão valorizados os diferentes saberes da cultura local traduzidos em ações simples do cotidiano dos alunos e seus familiares, ou seja, a forma de apropriação das plantas e da caracterização botânica de espécies selecionadas bem como as questões ambientais relacionadas às espécies. Nesta etapa teremos uma integração com os conhecimentos adquiridos nas aulas de ciências.

Desenvolvimento do trabalho:
Primeira etapa: Sensibilização (ano letivo de 2009)
  •  Estudos: Claude Monet, Burle Marx e artigos sobre  jardins e paisagismo.
  • Jardins Japoneses (Imagens para apreciação e simbologia)
  • Pesquisa sobre as plantas típicas da região onde está situada a escola, bem como pesquisa dos modos de cultivo das mesmas na comunidade, junto aos familiares dos alunos.
  • Confecção de maquete (grupo de alunos) idealizando um pequeno jardim e estudos prevendo o acesso dos alunos cadeirantes ao mesmo.
  • Visita ao Consulado do Japão para coleta de materiais.
  • Desenhos e pinturas, - Tema: A natureza presente no pátio escolar.
  • Exposição dos trabalhos desenvolvidos  ano letivo.

Segunda etapa: Implantação (ano letivo de 2010- Em andamento)
  • Pesquisa sobre as características e o cultivo de plantas ornamentais durante as aulas de Ciências e realização de uma campanha na comunidade para a coleta de mudas e troca de experiências sobre técnicas de plantio. A partir de tal conjunto enfocaremos aspectos relacionados à botânica, meio ambiente, cestaria, música, poesia, obras de arte, privilegiando e valorizando elementos da cultura local. 
  • Montagem dos jardins idealizado nas maquetes.
  • Planejamento de espaços que proporcionem sombra, como pergolados (estruturas em madeira), uma vez que a escola dispõe de uma grande área ensolarada.
  • Confecção de placas para o pátio escolar. Finalidade: Identificação das espécies de árvores, plantas, flores e mensagens incentivando a preservação da natureza.
 Nesta etapa  percebemos algumas necessidades:
  • Criar uma equipe, que nomeamos como “Patrulha da jardinagem”, composta por uma dupla de alunos revezados, cuja função será fazer a manutenção dos jardins. 
  • Buscar parcerias com entidades visando apoio. 
  • Sensibilizar todos, não só os alunos, professores e equipe diretiva, mas também a equipe de limpeza, da merenda, da guarda escolar bem como a vizinhança e os familiares dos alunos. 
  •  Prever a continuidade do projeto após sua implantação, uma vez que necessita de constante manutenção.
Avaliação:
A  leitura do local à ser trabalhado, o uso, as intenções e interações entre professores, alunos e comunidade trazem a cada projeto personalidade própria, pulsando energias diferentes.
Enquanto professora,  sinto necessidade de buscar conhecimentos extras em relação às características do projeto, já  que exige uma “bagagem” que não disponho em minha formação.   Quanto a mim e aos meus alunos, com certeza nunca nos sentimos tão próximos como estamos nos sentindo durante esta experiência. As atividades   realizadas no pátio escolar transformam alunos agitados em alunos concentrados e mais tranquilos. É fato, conversamos muito mais do que habitualmente e de muitos ouço  histórias muito interessantes. Apesar de muito jovens, muitos já dominam várias técnicas , estas adquiridas ao acompanhar os pais no trabalho ou fazer um “bico” (prestar um pequeno serviço para alguém, como cuidar de um jardim por exemplo), como costumam dizer.
Outra situação que me chama a atenção é que mesmo quando não estamos em aula, muitos alunos me procuram e me pedem antecipadamente para realizar determinadas atividades do projeto. Outros me perguntam se  determinado parente pode mandar “tal” planta para a escola.
Outro dia o guarda escolar me procurou, mostrando-se preocupado, pois viu alguns alunos jogando bola perto dos jardins. Comentei com ele que este é um trabalho que leva um tempo, pois depende de conscientização.
São estas as principais avaliações que faço com meus alunos: Muito além das pesquisas e técnicas, procuro promover conversas e observar o comprometimento de cada um.
Percebemos inúmeras situações novas durante o andamento do projeto e a necessidade de correções no rumo do planejamento .  O solo mostrou-se impróprio para receber algumas espécies de plantas, então buscamos apoio do Horto Municipal e da Secretaria da Agricultura, sendo que esta nos enviou um técnico agrícola que nos dará as devidas orientações. Também solicitamos apoio da equipe diretiva para a aquisição de ferramentas adequadas para o plantio e manutenção dos jardins. Buscamos parcerias ligadas à algumas floriculturas do Município, sendo que uma delas fará o mapeamento técnico do pátio escolar para a implantação do projeto. Outras parcerias foram firmadas, como o Consulado do Japão e o Rotary Club. Através delas recebemos informações sobre palestras e temos a possibilidade de realizar intercâmbios. 
Precisamos conversar mais com os alunos e familiares, pois com o surgimento dos primeiros jardins   notamos que faltam cuidados durante o fim de semana, já que a escola participa do programa “Escola Aberta”, onde são oferecidas oficinas para a comunidade. Nestas ocasiões percebemos mais descuidos com as plantas e com a limpeza do pátio. A maioria das pessoas que integram o espaço escolar afirmam que gostam da natureza, mas ainda são poucas as que de fato interagem com ela por iniciativa própria.
Sabemos que este é um projeto que requer tempo. Tempo para aprender, conscientizar, sensibilizar...
Os jardins tem muitas coisas boas para oferecer a quem se dedica a ele, começando pela contemplação de seus encantos. O deleite estético  é importante para relaxar a mente, coisa rara nos dias de hoje. A presença de um jardim renova-nos e integra-nos com os ritmos naturais. É fundamental para gerar pessoas saudáveis e tolerantes, tão necessárias nestes nossos tempos de agito e confusão.
Para finalizar este relato deixamos registrado nosso desejo maior,  traduzido no cordel de Oliveira de Panelas e Isaura de Melo Souza:
...Escola com desconforto, a criança se aperreia, vai sem graça e vem sem graça, muitas vão de cara feia, como se fosse, a escola, uma espécie de cadeia.
Ou se faz para a criança melhores salas de estudo ou o Brasil permanece um país sem conteúdo. Por fora, somente a casca; por dentro, faltando tudo.”

Premiações:
Ano: 2009
Prêmio Rotary Club – Categoria:  Meio Ambiente – 1o. Lugar
Prêmio Promotor da Paz – Câmara dos Vereadores de Gravatai – Categoria: Escola – 1o. Lugar

2010:
XI Premio “Arte na Escola Cidada”- Finalista

Bibliografia:
DOURADO, Guilherme Mazzo. Burle Max. O prazer de viver e trabalhar com a
natureza (entrevista). Revista projeto n. 146, ort. 1991, pp. 58-77. São Paulo.
FEDRIZZI, Betariz. Paisagismo no pátio escolar. Porto Alegre: Editora da
Universidade, URFGS, 1999.
http://veronicabarbosa.blogspot.com/2009_09_01_archive.htmlCordel :Lugar de Criança é na escola: Oliveira de Panelas e Isaura de melo Souza
Japao Fundation  - São Paulohttp://www.fjsp.org.br/ -
 Secretaria da Educação Fundamental, (1998). Parâmetros curriculares
nacionais: Arte. Brasília: MEC/SEF
Lucie-Smith, Edward: FLORA -  Jardins e plantas na arte e Literatura.2001. Everbest Printing- Versão Portuguesa.
KAYSER, Arno. A Reconciliação com a Floresta – Por uma atitude ecológica – 2a. ed., rev. E ampl. pp. 80- Porto Alegre: EDIPUC, 2010.